Neste dia de São Francisco de Assis, 04 de outubro, relembramos a homilia do nosso fundador Frei Hans Stapel, na Basílica de São Francisco, no último dia 26 de setembro durante a Peregrinação Jubilar a Roma. Assis foi um dos locais visitados pelos peregrinos e demais membros da comunidade. Em sua fala, Frei Hans nos convida a ir ao encontro dos que mais necessitam. A viagem à Itália faz parte das comemorações pelos 40 anos da Fazenda da Esperança.
Todos nós que somos filhos da Esperança somos convidados a encontrar o sentido da vida no pobre, no drogado, naquele que precisa de saúde, em todos que sofrem. “Francisco tinha medo, mas a Palavra foi mais forte. Esse desejo de amar Deus, que não é amado, foi mais forte. E aqui ele fez uma experiência que todos nós devemos fazer. Alguns fazem só na hora da morte. Mas é possível fazer antes, abraçar o leproso”, refletiu Frei Hans.
Francisco nasceu entre 1181 e 1182, na cidade de Assis, Itália. Seu pai era um rico e próspero comerciante. Foi batizado em Santa Maria Maior com o nome de João (Giovanni). Mas quando Pietro Bernardone voltou de uma viagem à França, mudou de ideia e resolveu trocar o nome do filho para Francisco, prestando uma homenagem àquela terra.
No dia 16 de julho de 1228, São Francisco de Assis foi canonizado pelo Papa Gregório IX. Tornou-se o padroeiro dos animais, pela sua admiração e relação estreita com a natureza. Também foi elevado a padroeiro principal da Itália, em 1939 por Pio XII.
Leia, na íntegra, a homilia de Frei Hans na Basílica de São Francisco de Assis:
Queridos Bispos aqui presentes, também queria cumprimentar o Bispo Auxiliar Manfred Grothe de Paderborn. Tua presença me deixa muito contente.
Também fico muito contente em ver tantos padres, porque eu sei quão bem eles fazem à nossa obra. Não é possível acolher os jovens das ruas, das cadeias, sem ter a presença dos padres que, constantemente, dizem: ‘eu te perdoo, teus pecados estão perdoados’, e também dão a Eucaristia, o Corpo de Jesus, que alimenta e faz com que homens velhos se tornem homens novos.
Dois desses jovens, que um dia chegaram à nossa obra pedindo porque estava nas drogas, hoje estão concelebrando conosco. Me alegra muito!
Também quero agradecer a presença das Irmãs religiosas. Só Deus sabe o quanto vocês valem nas Fazendas. São mais de 20 Congregações trabalhando conosco. Me alegro muito com a vossa presença.
Mas também quero me dirigir a todos que vão nos assistir através da televisão. Esses jovens do mundo inteiro, tantos da Família que gostariam de estar aqui e não podem. Não é possível vir todos. Mas a todos vocês também quero me dirigir nesta manhã.
Especialmente, me lembro daqueles que, ontem à noite, foram pegos de surpresa, quando a companhia de ônibus, de forma irresponsável, cancelou sete ônibus dizendo que não tinha motorista. Alguns conseguiram, de um jeito ou de outro, chegar, mas outros, infelizmente, não estão aqui. Mas vão receber as mesmas graças.
Depois, quero me dirigir hoje, especialmente, ao Nelson, que hoje celebra 61 anos e, com ele, todos os aniversariantes que estão celebrando a vida.
Também quero falar para aqueles que já partiram para o Paraíso. Muitos da Família estão lá e estão unidíssimos conosco. Ainda ontem, o irmão de um de nossos partiu e ele deixou a Família cuidar e está aqui conosco. Vamos rezar por ele e por todos que estão ligados nesta Família.
Quem nos une, São Francisco e Chiara Lubich, duas espiritualidades que influenciaram a nossa obra desde o início. O Frei, hoje, já falou hoje tão bonito, mas quero dizer algumas coisas que me tocaram na vida de Francisco e que tem muito a ver com a nossa vida e com o nosso Carisma.
Francisco nasceu como muitos de nós, alguns com mais riquezas, outros com menos, mas tinha muitos sonhos, como nós também. Eu conheço os sonhos da juventude, mas também muitos outros querem ser ricos, querem ganhar na vida, outros querem ser importantes na política, outros querem mais do que os outros. Esses sonhos são legítimos, nos acompanha nascemos com isso.
Francisco tinha até no dia que Deus entrou na história dele. E quando Ele entra na nossa história o que ele faz? Nos deixa cair do cavalo, nos faz entender que não são esses sonhos que nos realizam, tem algo a mais.
E, assim, Francisco, sonhando em ir à guerra, gastou muito dinheiro com cavalo e tudo. E, aqui, perdeu, ficou preso, ficou doente. Todos os sonhos se acabaram. E, neste momento da fraqueza, da desgraça, Deus pode falar. E Ele falou.
E Francisco entendeu que este Deus que ele antes não dava muito valor, apesar de ser da Igreja, este Deus ama Ele infinitamente. Ele reconheceu que o amor não é amado. Isso também é a situação de muitos de nós.
Muitos jovens chegam na Fazenda na frustração. Quando tudo cair, perderam a família, os bens, perderam tudo. E na Fazenda, graças a Deus, escutei tantos e tantos, me diziam que precisavam perder tudo para encontrar Deus. Também eu, na minha vida, eu fui como missionário para o Brasil, com muitos sonhos.
Pensei que iria missionar, que ia me realizar, não sei o que. Entrei no noviciado e aqui passei minha primeira frustração. Não era assim como eu sonhava. Fiquei doente e o médico me deu como tratamento ficar isolado, num tratamento lá, não entendi bem.
No quarto, sozinho, parecia que tudo acabou. Eu me perguntei porque deixei minha família, meu irmão gêmeo, meus pais, minhas irmãs. Deixei minha Pátria e, agora, sou nada. Nestes dias, sozinho no quarto, eu casei com Jesus abandonado.
Me emociona, hoje, ainda lembrar neste momento onde escolhi Ele. E não a missão, nem as paróquias, nem o sucesso, somente Ele na cruz. Depois, eu descobri quanto Deus é grande. E quem escolheu Deus, naturalmente, procura Sua Palavra.
Procura força na Palavra para fazer aquilo que Deus pede. Não mais o que eu quero, mas o que Ele quer. E Francisco fez assim. Ele foi atrás de Deus.
Na sua primeira regra, só queria que o Papa reconhecesse que os frades vivem o Santo Evangelho. Basta isto. E também nossa obra, tenho certeza absoluta, vai para frente se vivemos a Palavra em radicalidade. Isto ficou muito forte para mim. Quando eu caí, no Natal, quebrei algumas costelas. Fiquei no hospital das queridas irmãs do Frei Galvão.
E sozinho, na UTI, perguntei muitas vezes. Constantemente, eu pergunto: ‘Deus, o que você quer ainda de mim? O que eu posso fazer neste pouco tempo, porque tudo passa? E, fortemente, Ele me disse: se santifica e santifica toda a Família da Esperança’.
Eu peguei um susto e disse: ‘Deus, como é possível? Você me conhece, minha história, meus pecados. Você conhece aqueles que estão comigo com tantos pecados. Tantos vêm das cadeias, da prostituição, das ruas. Como santificar?’ E Ele me disse muito forte: ‘vivem a Palavra’. E para mim ficou claro, numa luz forte, na Palavra está a solução dos nossos problemas de hoje. Também a Igreja está na grande crise porque afastou-se muitas vezes da Palavra.
É verdade, hoje se canta, se bate palma, mas viver a Palavra é outra coisa. Viver a Palavra, viver a caridade, ser sensível pelas necessidades do outro. E Francisco fez isto, foi atrás dos pobres. Ouviu a voz: ‘reconstrói a minha igreja’.
Começou com as pedras, mas tarde entendeu que era outra coisa. E, nesse momento, ele fez uma experiência que todos nós somos convidados a fazer, mas não é fácil. Ele abraçou o leproso, beijou o leproso. Nós não temos ideia do que significa a lepra, excluído de todos. Nem podia abraçar alguém da família, todos tinham medo. E quem tivesse contato podia pegar essa doença, apodrecer vivo.
Francisco tinha medo, mas a Palavra foi mais forte. Esse desejo de amar Deus, que não é amado, foi mais forte. E aqui ele fez uma experiência que todos nós devemos fazer. Alguns fazem só na hora da morte. Mas é possível fazer antes, abraçar o leproso. E qual foi a experiência mais forte que ele mesmo escreve?
Aquilo que antes era importante, a riqueza toda não tinha mais valor. Mas aquilo que era nojo, que dava angústia, medo, se tornou doçura. Constantemente, Francisco ia ao encontro dos leprosos. Eu sei que muitos de vocês fizeram essa experiência.
Encontrar no pobre, no drogado, naquele que precisa de saúde, em todos que sofrem, encontrar o sentido da vida. Muitos deixaram tudo para esse dia. Deste Carisma nasceu a Família da Esperança. E qual é a nossa vocação?
Todos são filhos da Esperança. Filhos da Esperança. Significa, como o Papa Bento nos escreveu: ‘levem a Esperança’, e ele escreveu em aspas: ‘Jesus Cristo ao maior número de jovens e todos que precisam’. Por quê? Ele disse porque ela dá liberdade e no momento presente constrói um futuro diferente. Levar a Esperança. Claro, só pode levar se tem. Se nós vivermos a Palavra, Deus entra na nossa vida.
A Palavra é Deus. Se comungarmos, Deus entra. Jamais vai morrer, porque já morreu e ressuscitou. Então é importante que permitimos que a Esperança entre na nossa vida para levarmos a todos.
Quem é filho da Esperança? São três coisas importantes: a base para entrar na Família. Se apaixonar por Jesus, por Deus, por toda a sua obra, pelo mundo, por tudo que é Deus, e Deus é tudo, Ele é amor. Se apaixonar por Deus. Segundo, se apaixonar pelo pobre, pelo excluído. Nós dizemos: ‘os pobres são a fonte da nossa inspiração’. Se você encontra desânimo, dificuldades, procura o último que te dá força. E, terceiro ponto, quem fez essa experiência, que tudo passa, e nada, nada tem valor, somente Deus, ele consegue também colocar em comum. Ele se liberta dessa doença que hoje toma conta do mundo. Querer sempre mais. Meu, meu, meu.
É incrível quanta gente tem que o que nunca precisa. Esquecem quem nos deu os bens foi Deus. E Deus deu para nós amarmos, e não para juntarmos e dizemos, isso é meu.
O que é teu você vai ver na hora da tua morte. O que pode levar no caixão, isso é teu. E só é possível levar o amor. Tudo passa, e passa muito rápido.
São Francisco tinha uma paixão pela morte. Nós vimos e ouvimos a explicação. Chamou a morte e amar, para mim como franciscano, custou a entender. Porque, primeira coisa, a morte parece que vai nos separar, vai nos tirar tudo. Mas não é verdade. A morte nos leva a tudo. Nos leva ao coração de Jesus. Eu sempre tento de encontrar coisas boas da morte.
Para me ajudar a perder todo o medo. Por exemplo, meus pais já faleceram há muitos anos. Tenho saudade deles. Mas não só meus pais, tantos e tantos amigos. Gente da nossa Família, quantos estão no céu. Eu quero encontrá-los. Quero abraçá-los de novo, quem me dá a possibilidade? Só a morte.
Também quero abraçar Jesus. Sou casado com Ele. Quero abraçar e dizer: ‘obrigado por tantas graças. Obrigado pela Tua presença que nos curou, que expulsou os demônios. Que nos deixou unidos. Obrigado. Obrigado pela multiplicação que Você fez e está fazendo’. As Fazendas no mundo inteiro. Obrigado. Quero dizer obrigado pelas vocações’.
Quem chama vocações? Jesus entre nós. Onde Ele está? O que mais Ele gostaria de dizer? Segue-me. E se Ele fala, os jovens entendem. Se nós queremos agradar com nossa casa bonita e riqueza, não funciona. Somente Deus pode chamar. Ele precisa estar entre nós para chamar. E está chamando. Então eu quero abraçá-lo, agradecê-lo. Também Nossa Senhora. Só Deus sabe como Ela é importante na minha história, mas também na história de todos vocês.
E depois, na minha casa, está a mãe do Nelson. Dona Ana. Muitos conhecem ela. Cinco anos com a AVC, sem se movimentar, sem falar, sem andar. Cada dia, quando visito, eu digo: ‘Dona Ana, um pouco de paciência. A morte vai te libertar desta cruz e você vai andar de novo. Se não tivesse a morte, estaria condenado para a eternidade numa cama’.
E depois também, caríssimos irmãos e irmãs, a situação que o mundo está, esta guerra. No Brasil, se quer aprovar o aborto. Incrível. Com naturalidade, como se fosse nada. Se esquece que ninguém consegue abortar a alma que cada criança tem.
Onde estamos? A corrupção não tem limite. Sem vergonha, diante dos olhos de todos. Quem pode nos libertar? Somente a morte.
Hoje, neste lugar de São Francisco, quero agradecer a Deus por este homem que nos abriu os olhos para enxergar tudo. Com os olhos da Páscoa. Que não fica preso nas coisas humanas. Nem ter medo da morte, mas ganha a liberdade de filhos de Deus. A liberdade de amar todos. A natureza. A fraternidade universal.
Quando cheguei hoje cedo em Assis, eu gostei deste lugar. Eu pedi a Deus: ‘ajuda nossos para não se perderem’. Correr atrás de mil coisas. É justo de ver. Pode visitar tudo. Mas o mais importante é encontrar a alma, o espírito de São Francisco. E levar isto para casa. Porque nossa Família, este Carisma que Deus aprovou da Esperança precisa deste espírito de São Francisco. Assim seja.